Estamos em Torres Vedras, na
Praça do Município. É um largo acolhedor, dominado pela fachada dos antigos
Paços do Concelho, hoje, galeria municipal. À direita, está um edifício mais
pequeno e simétrico, com um chafariz ao meio, elemento da praça que mais chama
a atenção. Faltam-me as palavras para descrever os seus motivos aquáticos e
está ali um peixe que não consigo saber qual é, de cabeça para baixo, da boca
do qual jorra água de forma constante e inesgotável, desde a sua construção, no
século XVIII, até aos dias de hoje.
Estamos aqui para mais um episódio
da insólita história de Torres Vedras, uma história, por vezes, difícil de
acreditar, mas inteiramente verdadeira. Bem, talvez não toda...
O antigo edifício dos Paços do Concelho foi restaurado
várias vezes ao longo da história, ao que tudo indica, inutilmente. Na verdade,
é admirável que ainda aqui esteja: no século XVI foi atacado durante um motim
popular, dois anos depois de ter sido restaurado; no século seguinte, pouco
depois de outra reparação, escapou por um triz dos revoltosos contra o Duque de
Olivares e os impostos castelhanos; mais tarde, em meados do século XVIII,
ardeu quase completamente... Não por razões políticas, mas porque a cadeia
ficava no rés-do-chão, e um jovem que se encontrava preso a curar uma bebedeira
tentou fugir pondo-lhe fogo. Era filho de João Franco Costa, então escrivão dos
órfãos, que nunca mais se recompôs da vergonha, nem das dívidas, porque teve de
pagar as obras. E foi então que D. José I, rei de Portugal e dos Algarves,
mandou construir o chafariz, em 1776, para terem água mesmo aqui ao lado, não
fosse a história se repetir. Segundo o rei, assim se fez para comodidade da
cadeia e do povo e, conforme a modéstia típica das classes dirigentes, mandou
escrever isso mesmo no chafariz, um pouco acima do misterioso peixe, mas não
pagou as obras...
Texto e performance: Luís Correia Carmelo.
Tradução: Sofia Maúl
Música e ambientes sonoros: Miguel Neto.
Instalação plástica pop-up: Carlos Augusto Ribeiro
Coordenação e web: José Barbieri
Multimédia: Rafael Del Rio
Produção: Memória Imaterial CRL
Projeto: LU.GAR.TERRITÓRIOS CULTURAIS
Público-alvo: todas as idades.