Somos todos sobreviventes.
Sob os nossos pés a terra é feita de vozes e ossos de incontáveis
vagas humanas. Aos mortos devemos o que temos e o que somos hoje.
Nós, os vivos, gostamos de organizar os nossos vislumbres do passado
por eras. Referenciamos essas eras com os nomes vencedores de heróis,
ideologias, religiões e sistemas.
Nesta dinâmica global em que se transformou a humanidade os
vencedores são escassos, transitórios, mas marcantes. Vivemos sob as
suas regras, a sua cultura, o seu mercado, o seu medo, a sua memória.
Os vencidos são a enorme maioria que vive num silêncio ensurdecedor,
tantas vezes autoimposto.
Os vencidos acreditam na sua derrota, aceitam a
sua menoridade perante os vencedores. Calam.
Esquecem a sua
originalidade, perdem a sua visão do mundo, a sua cultura. Ninguém sai
inteiro deste jogo: os vencedores obliteram parte de si mesmos para
vencerem.
Esta é a antiga tradição das sociedades humanas, o balanço do
desequilíbrio.
Esta instalação estreia no Museu Damião de Góis e das Vítimas da
Inquisição em Alenquer, um espaço que, por si, representa uma erupção
das vozes vencidas que procuram testemunhar a sua permanência no
delicado tecido da humanidade, sobrevivendo à aniquilação decretada,
instituída.
Com este LU.GAR.OCULTO instalação #4, procuramos quebrar este
silêncio com vozes - reais, fictícias e ficcionadas - sugadas deste
grande vazio prenhe de dor sublimada, alegrias secretas, e reflexões
amargas.
Articula-se a partir das pinturas de Carlos Augusto Ribeiro, que
prolonga a vida de um heterónimo anónimo que iniciou a sua carreira em
2017 na exposição e livro DITO ISTO, - um pintor de anúncios e cartazes
publicitários, um personagem que delapidou a vida publicitando utopias,
revoluções e estratégias comerciais alienígenas.
Este pintor anónimo tem
uma obra secreta que produz uma série de “descortesias, rascunhadas em
papeis velhos, enviadas para si próprio … apelos mortos do vazio
interior. A ideia é o seu cão. Um rastro de palavras. Pó de giz.”