Rua do Correio Velho

Diligências a entrar e a sair numa correria desenfreada com missivas de selos reais ...

Ouvir Podcast
voltar a procurar

Diligências a entrar e a sair numa correria desenfreada com missivas de selos reais encerradas em pesados baús. O Correio-Mor era cargo importante, criado em 1606 e sendo um privilégio da família Gomes da Mata. Esta artéria tinha a designação de Calçada do Correio até ao terramoto de 1755, sendo que o Velho viria depois. O palácio onde o correio se encontrava era grande e opulento, encaixado na encosta e virado a sul, olhando o rio e a cidade baixa. Era um poiso bonito, mas má escolha para as bestas que a tinham de subir, ofegantes, vindas da cidade baixa. Tinha um pátio grande onde as carruagens se arrumavam e a entrada era feita de pedrinhas brancas e pretas, pequeninos seixos rolados que faziam uma composição geométrica. 

Mas esta era a casa da família, as carruagens com o correio real ficavam-se pelo lado sul. Em 1992 aqui se fizeram escavações e aqui se encontrou o palácio, quase inteiro na sua divisão interna, mas repleto de escombros do terramoto, pedras soltas de antigos portais, cantarias brancas bem esquadriadas. Tudo reaproveitado para encher o interior daquele palácio. Hoje, quem olhar pelo gradeamento imponente, verá do lado esquerdo um jardim de buxo, mais alto que a entrada para carros que agora substituem coches e seges de outrora. Era exatamente aí que se localizava o Palácio do Correio-Mor e antes dele as termas públicas que havíamos encontrado ao subir a Travessa do Almada. Esta rua teve muitas outras vidas. Antes de ser correio foi designada, corria o séc. XV, por Rua do Pé da Costa e já depois do grande terramoto também lhe foi dado nome de Rua de Santo António. O nome de Velho só lhe veio depois, quando o Correio se instalou finalmente num outro antigo palácio, o de Marim-Olhão, para os lados da Calçada do Combro. O palácio a São Mamede, reconstruído após o grande cataclismo de 1755, foi finalizado em 1776. Manuel José da Maternidade da Mata de Sousa Coutinho, 1º Conde de Penafiel, morre em 1859 e empresta-lhe o título, razão pela qual esta construção senhorial também hoje é conhecida por Palácio dos Condes de Penafiel ou, simplesmente, Palácio de Penafiel. Do séc. XIX ficaram bem conhecidas as festas que aí tiveram lugar. As luzes eram tantas que toda a colina ficava iluminada e era ver as senhoras com os seus majestosos vestidos de cetim e rendas a chegarem ao palácio, rivalizando com as célebres festas da Quinta do Farrobo, às Laranjeiras. Num dos bailes mandaram-se vir 16.000 camélias do Porto só para enfeitar as salas do palácio e durante muitos anos ficou na memória aquela festa que reuniu mais de um milhar de convidados. Tantas vidas e tantas lembranças que as ruas guardam, mas só se lhes perguntarmos os segredos. No muro alto que ladeia o palácio pelo seu lado nascente, vemos hoje um painel de azulejos que celebra a vida de um padre que conheceu mundo e dedicou a sua vida à pregação e a cuidar dos menos afortunados. Padre António Vieira tem um mural a ele dedicado e a frase que a ele pertence desenha-se nessa parede alta onde se lê “Para nascer, Portugal! Para morrer, o Mundo.” O padre, como também consta no mural, nasceu em 1608 aqui próximo, mais para cima, na rua que, até à primeira metade do séc. XVIII, se chamava Rua dos Cónegos. Hoje, tal rua já não existe pois sobrepõe-se uma outra, a Rua da Saudade. Mas esta é outra rua, também com muitas histórias, das quais contaremos algumas quando terminarmos de subir esta ladeira que nos conduz até ela.